Aquisição de imóveis rurais por estrangeiros
Contribuição de Valor Econômico
02 de setembro de 2010
Aquisição de imóveis rurais por estrangeiros
Somente agora, após dois anos do parecer CGU/AGU nº 01/2008-RVJ ser lavrado pela Advocacia-Geral da União (AGU),
confirmou-se aquilo que autoridades públicas federais brasileiras cogitavam em termos de restringir a compra de terras
brasileiras por empresas nacionais formadas por capital estrangeiro.
Sob o argumento de melhor defender a soberania nacional, a preservação dos nossos recursos naturais, e de que havia
"divergência" entre pareceres anteriores daquele órgão sob a ótica da mutação constitucional, o "novo" parecer da AGU -
datado de 03 de setembro de /2008 e só agora adotado pelo Advogado Geral da União, de forma vinculativa para toda a
administração pública federal - conclui haver restrições legais à aquisição de imóveis rurais por pessoas jurídicas brasileiras
com maioria do capital social detida por estrangeiros.
Qual foi o caminho trilhado pelo ilustre parecerista para propor essa restrição?
No Brasil a aquisição de imóveis rurais por empresas estrangeiras foi restringida pela Lei nº 5.709, de 1971. Essa norma
também sujeitou ao regime ali estabelecido pessoas jurídicas brasileiras das quais participassem, a qualquer título,
pessoas estrangeiras físicas ou jurídicas e que tivessem a maioria do seu capital social e residissem ou tivessem sede no
Exterior.
Além de questões técnicas, com essa lei as pessoas jurídicas estrangeiras só poderiam adquirir imóveis rurais destinados à
implantação de projetos agrícolas, pecuários, industriais, ou de colonização, vinculados aos seus objetivos estatutários, e
desde que aprovados pelo Ministério da Agricultura, ouvido o órgão federal competente de desenvolvimento regional na
respectiva área.
Para que se possibilitasse o controle dessas obrigações, a referida norma estabeleceu que os cartórios de registro de
imóveis deveriam manter cadastro especial das aquisições de terras rurais, contendo memorial descritivo do imóvel, com
área, características, limites e confrontações e transcrição da autorização do órgão competente.
Outro limite imposto ao investidor era a de que a soma das áreas rurais pertencentes a pessoas estrangeiras não
poderiam ultrapassar a um quarto da superfície dos municípios onde se situassem. Ademais disso, pessoas da mesma
nacionalidade não poderiam ser proprietárias, em cada município, de mais de 40% desse limite.
Advocacia Bueno e Costanze
http://www.buenoecostanze.adv.br www.guaru.net! Produzido em: 13 September, 2010, 09:33
Essa norma, de 1971 - portanto editada sob a vigência da Constituição de 1967, com a redação da Emenda Constitucional
de 1969 -, conviveu com o texto original da Constituição Federal de 1988, que tratou genericamente da matéria no artigo
171.
Na redação original da Constituição Federal de 1988 havia distinção entre empresas sediadas ou não no país, e entre
empresas de capital nacional e as que assim não se classificassem. Era com base na aludida norma federal (Lei nº
5.709, de 1971) que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) atuava no controle da aquisição de
imóveis rurais no Brasil por empresas criadas com capital estrangeiro.
Considerando que o artigo 171 da Constituição Federal de 1988 foi expressamente revogado pela Emenda Constitucional
nº 06, de 1995, suprimiu-se a quebra de isonomia entre empresas brasileiras. A própria definição de "empresa brasileira", a
partir da EC nº 06, de 1995, passou a ser aquela estabelecida sob a égide das leis brasileiras, com sede e administração
no Brasil, como claramente constou na Exposição de Motivos 37/95 justificadora da citada emenda constitucional.
Essa vinha sendo a orientação jurídica governamental, por se basear no Parecer da Consultoria da União, GQ-181, de 17
de dezembro de 1998, que reexaminou outro parecer proferido em 1994, sob o nº AGU/LA-04/94, e vinculou toda a
administração pública.
A linha adotada naquele parecer se concentrou na premissa de que a Constituição de 1988, apesar da revogação do
aludido artigo 171, trata da questão relativa à participação de estrangeiros ou de capital estrangeiro em vários dispositivos,
ora de maneira específica, ora genérica, ora absoluta, ora dependente de legislação infraconstitucional (art. 222:
propriedade de empresa jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e imagens; parágrafo 3º do artigo 199:
assistência à saúde no país; e art. 192: sistema financeiro nacional).
O parecer anterior - agora revisto pela AGU - havia concluído que a matéria relativa ao tratamento a ser dado ao capital
estrangeiro encontrava-se, também, de maneira genérica, referida no artigo 172 da Constituição Federal, que, a
qualquer momento, poderia ser regulamentado pelo Congresso Nacional criando restrições ao capital estrangeiro no país.
Por isso, era regra no âmbito federal não ser necessária autorização do Congresso Nacional no caso de aquisição ou
arrendamento de propriedade rural por empresa brasileira, controlada por pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras.
Esse posicionamento estava valendo até a chegada do novo parecer da AGU, cabendo ressaltar que a sua validade é,
apenas, no âmbito interno da administração pública. Nas palavras do ilustre autor do parecer: "apesar de sua inegável
relevância, (o parecer) será limitado e incapaz de enfrentar todas as dimensões do problema."
Assim, em que pese a existência do novo parecer repristinando a Lei nº 5.709/71, e a possibilidade de "novos
pareceres" desafiadores da segurança jurídica, a qualquer momento o Congresso Nacional poderá alterar as regras
quanto a aquisição de terras por empresas brasileiras com capital estrangeiro. De fato, com a revogação do artigo 171 pela
Emenda Constitucional nº 06, de 1995, a matéria foi deixada à discricionariedade do Poder Legislativo, que poderá
discipliná-la por meio de ato normativo ordinário.
Sérgio Guerra
Advocacia Bueno e Costanze
http://www.buenoecostanze.adv.br www.guaru.net! Produzido em: 13 September, 2010, 09:33
Sérgio Guerra é professor titular de direito administrativo da FGV DIREITO RIO
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser
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Fonte: Valor Econômico
02/09/2010
Advocacia Bueno e Costanze
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