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sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Globalização e Internacionalização do direito

Globalização e Internacionalização do direito

Embora o tema da globalização traga consigo uma carga ideológica e passional, é possível também analisá-lo a partir de um ponto de vista pragmático. Nesse sentido, muitos sociólogos e economistas têm se debruçado a tratar cientificamente do tema, longe das ideologias que contaminaram o mundo no século XX.

Visto dessa forma, a globalização nada mais seria do que uma internacionalização da atividade empresarial e econômica, com uma rapidez e força jamais vistas na história da civilização ocidental (Faria, 1999). Essa internacionalização foi potencializada por uma série de fatores, tais como a redução dos custos de transporte, a tecnologia e a informática. Com isso, o mundo perdeu parte de suas fronteiras e o Estado-Nação perdeu parte de sua soberania.

Nesse período de globalização, parecem existir evidências de que os países em desenvolvimento se beneficiaram do processo, como é o caso da China, Índia, Coreia do Sul e Brasil. Quem parece ter mais perdido foi a Europa, isto é, fundamentalmente os países que criaram um amplo sistema de proteção social, sem o correspondente crescimento da população economicamente ativa e, portanto, de sua economia.

Os juristas teriam de considerar os reflexos dessa realidade para o seu campo. Se não se pode simplesmente abandonar direitos constitucionais adquiridos, bem como ceder a toda e qualquer exigência de empresas dispostas a investir em diferentes países, também não se pode mais pensar em soluções jurídicas afeitas a apenas ao território de um país.

O desafio aos nossos juristas será construir um direito dentro de novos paradigmas

Portanto, em tempos de globalização econômica, não é apenas a atividade econômica que se internacionaliza. O direito também acaba seguindo este caminho. Isso significa que, paralelamente à atividade das empresas, surge um direito costumeiro, derivado das práticas e usos comerciais fundado, sobretudo, nas relações contratuais estabelecidas para dar organização à atividade produtiva e financeira das empresas (lex mercatoria ou soft law no jargão jurídico).

Mas as mudanças no campo jurídico não terminam por aí. Paralelamente à perda de força do Estado-nação, sua ordem jurídica normativa também cede espaço a soluções internacionais.

Nesse sentido, pouca força tem o direito ambiental brasileiro de combater as mudanças climáticas, pois ele não obriga empresas que atuam em outros países, inclusive que fazem fronteira com o Brasil. O mais provável é que o rigorismo local tenda a dificultar investimentos em infraestrutura, sem a contrapartida de proteger à coletividade, sujeita à mesma atividade em outros países. Portanto, não chegaremos a lugar algum sem um direito internacional do meio ambiente. Eis o espaço para uma discussão de padrões mínimos de proteção ambiental no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), como, aliás, foi feito em relação à propriedade intelectual – e não se acredita que a proteção das patentes e direitos autorais seja mais importante para a sociedade do que a do meio ambiente.

Da mesma forma, o direito tributário brasileiro terá de competir com estruturas tributárias de outros países. Não é mais possível construir um aparato estatal obeso e sugador de recursos da sociedade se isso descolar das práticas de países que concorrem com o Brasil e que podem ter um Estado mais eficiente, enxuto e com menor amplitude de proteção social, como China e Índia.

No mesmo diapasão, o direito administrativo brasileiro é tipicamente do século XIX. Costuma-se ainda colocar o Estado em um pedestal, que tudo pode ao longo da relação contratual. O direito administrativo terá de deixar os governos livres para parcerias público privadas. O jurista terá de pensar em contratos que protejam a administração pública, mas sem encontrar “inconstitucionalidades” em toda a esquina. A própria licitação dá sinais de esgotamento e de agonia, deixando muitas empresas públicas à beira da falência pela lentidão do procedimento e ineficiência na seleção de melhores parceiros.

E talvez o mais caduco de todos os campos do direito brasileiro seja o trabalhista. O direito trabalhista brasileiro serve tanto para grandes multinacionais, como também para as micro e pequenas empresas que sofrem para sobreviver nos seus primeiros anos de surgimento. Além de atingir empresas absolutamente distintas da mesma maneira, o direito laboral brasileiro (ainda de raiz marxista de “luta de classes”) pode estar defasado frente a uma maior flexibilidade de outras legislações. Surge aí também o espaço para um direito mínimo do trabalho e que poderia ser discutido igualmente no âmbito da OMC.

No passado, os juristas foram obrigados a pensar em soluções jurídicas provenientes de países desenvolvidos, sobretudo da Europa. Mas não são esses países que ameaçam o sucesso do Brasil, se é que se pode fazer essa metáfora. O desafio aos nossos juristas será construir um direito dentro de novos paradigmas, que pavimente o caminho para o século XXI. Os principais ramos que devem ser flexibilizados e reestruturados são o ambiental, o tributário e o trabalhista cujas soluções deverão ser trabalhadas dentro de padrões mundiais mínimos construídos em consenso com orientais e latino-americanos, sob pena de sermos vítimas de um excesso de regulação estatal sem o correspondente benefício à comunidade.

Possui doutorado em Direito. Tem experiência na área de direito civil, direito internacional privado, novo código civil, contratos, arbitragem, contrato internacional e direito constitucional. Atualmente é pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Berkeley, Califórnia, e professor de pós-graduação da Unisinos.

Fonte: http://www.unisinos.br/blogs/mba-e-especializacao/2011/08/23/globalizacao-e-internacionalizacao-do-direito/

 

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